domingo, 15 de junho de 2014

Towards her



Era de tarde, umas quatro e dez. O Sol mostrava seu vigor alaranjado naquela tarde enquanto uma igreja enchia de pessoas. Não existia nada especial naquele final de semana, exceto para as pessoas presentes naquela igreja. O templo era uma construção barroca, cheia de pinturas por dentro e estátuas por fora. Logo no topo da igreja existiam três gárgulas que olhavam para baixo e que inquietava o coração de quem os percebia.
Todos que chegavam naquela igreja estavam usando trajes sociais monocromáticos. Algumas pessoas riam, enquanto outras choravam ou ficavam indiferentes. As crianças estavam emburradas nos bancos, e o silêncio era uma tendência naquele ambiente. Qual era a razão deles estarem ali? A razão provavelmente estava naquele homem perto do altar que trajava roupas sociais. Estava imóvel, como se esperasse alguém. Ele não falava nada, nem fazia nada; apenas ficava lá, imóvel. Perto dele estavam vários homens de terno, todos quietos e atentos ao padre. As pessoas apenas olhavam para ele, faziam comentários e algumas até choravam. O padre, que estava perto desse homem, também não falava com ele, mas olhava impacientemente o relógio.
O templo não estava cheio, mas logo estaria com o constante fluxo de pessoas que chegava. Haviam flores ao longo de um lindo tapete vermelho, que estava estendido desde a porta até o altar. Também existiam velas, sendo estas inúmeras e espalhadas por toda a igreja.
— Ela não chega logo — disse uma mulher ao seu marido.
— Logo ela deve estar aqui — respondeu ele.
— Não tenho muito tempo, quero que ela chegue logo para acabar com isso.
Passados alguns minutos, a atenção da igreja se volta para fora... Então a noiva chega, causando o silêncio e pranto de alguns. O padre então fica sério e se apronta. A noiva então começa a caminhar em direção ao homem de terno, que provavelmente era seu noivo. A volta de seus olhos estava inchada e escura, indicando falta de sono ou depressão. Seu rosto era pálido, contrastando com seus negros e lisos cabelos. Seu caminhar era delicado, inseguro e fraco. Ela não estava sendo acompanhada pelos seus pais até o altar. Ao chegar perto do homem, os pais da noiva a soltam e ficam parados no caminho enquanto ela se aproxima dele.
— Eu te amo! — disse ela antes de beijá-lo.
O noivo não respondeu nem as palavras, nem o beijo, mas aquilo não foi surpresa pra ninguém. Depois de se declarar ao seu amado e beijá-lo, o padre dá um sinal para os homens de terno, que fecham e levam o caixão com o noivo para o carro funerário. A hora do enterro havia chegado.

quinta-feira, 12 de junho de 2014

Pensamento: Homúnculo

A você, que gosta de rotular e classificar pessoas por gênero, sexualidade e cor: o meu desprezo e meu nojo.
Como alguém consegue ignorar as singularidades, paranoias e a beleza que cada um de nós temos?
Acusam-me de ser incapaz e até de não ser, de que não sei de quem sou e que me encontro indeciso. A real indecisão da vida é quando passamos a olhar mais para o viver alheio do que para a própria alma, é quando focamos nossa atenção nas pessoas em vez de em nossos problemas. Me diga qual é o teu verdadeiro problema: o teu próximo ou você?
O teu preconceito mata não só o que há de bom em sua alma, mas tudo que tem cor e vida em seu âmago. Ora, as pessoas são como espelhos: os defeitos que vemos nelas, na verdade, são os nossos refletindo nelas. Quando enviamos ódio a esses espelhos, ele acaba voltando, como se o receptor o enviasse de volta para o remetente. Como esse ódio era seu filho e sua criação, ele volta crescido e multiplicado, envenenando sua vida e amargurando sua alma.
Sabe aquelas pedras que você atira nas pessoas? Pode não parecer, mas elas machucam, não só o físico, mas o emocional, já que você não está atacando só o físico delas, mas sim o que aquelas pessoas são, querendo ou não.
Tudo é relativo e tudo é subjetivo. Vivemos em um mundo feito por explosões, estrelas e humanos. Bom, as explosões (ou explosão) deu origem ao universo, a respeito disso não podemos fazer nada, a não ser estudar. As estrelas, bem, dizem que somos feitos de poeira estelar, não é? A respeito disso também não podemos fazer muita coisa, a não ser culpar aquelas que nos formaram. Enfim, o mundo também foi criado pelos humanos, e sobre isso podemos mudar alguma coisa. Observamos humanos, convivemos com humanos e somos humanos — então, o que te faria melhor que os outros? Um pouco mais de celulose guardada no bolso, talvez? Ou uma ideologia diferente?
Se você odeia as pessoas pelo que elas são, então você odeia a si mesmo pelo que é, pois, por mais que tente justificar seu preconceito, você não deixará de ser alguém que odeia os seres humanos por serem humanos — até mesmo você — já que os preconceituosos costumam julgar pelo que as outras pessoas são sem pensar nelas como pessoas.

quinta-feira, 5 de junho de 2014

Conto: Loteria

"E, para a complexidade do universo, só digo que estou perplexo. Em meio ao caos emocional, me entristeço vendo coisas banais e filmes sentimentais. Não consigo pensar, está tudo tão louco, tão caótico. Não sou algo ou alguém tão simples e comum, bem sei também que ninguém é simples e comum, mas digo que não sou usual, nem superficial, nem típico. Se fosse superficial, coisas superficiais me alegrariam e me tornariam a viver novamente, mas não.
Enquanto pensava, peguei um bilhete na carteira. Era um bilhete da loteria federal, comprei hoje quando passei pela cidade, acabei marcando alguns números significativos que não desejo comentar (não ainda). Quando fui pagar o jogo, a moça que me atendeu respondeu meu "bom dia" com um sorriso sincero. Sincero, pois tuas palavras e teu corpo condiziam com sua expressão, já que o sorriso acompanhava sobrancelhas relaxadas, elevação das bochechas, ombros soltos, postura correta e os brilhos de seus olhos castanhos, que pareciam dar mais vida aos seus cabelos pela semelhança dos castanhos. Sei que não iria saber o nome dela nem seu signo pois, enquanto percebia essas características, realizava o pagamento — tudo por causa daquele tal de piloto automático, que ajuda a nos distanciar das pessoas ao nosso redor.
Saindo da casa lotérica, me imergi naquele mundo cinza e distante. Me senti como se estivesse naquela festa em que você não conhece ninguém, acaba observando tudo e desejando estar em outro lugar, pelo menos é assim comigo. Sou introvertido, não nego, e nem acho que seja um defeito, mas sim uma característica. Tenho menos pessoas estúpidas em minha vida, pois as evito ou termino com elas; para essas pessoas, minhas características se tornaram algo de chacota, qualidades boas viraram defeitos agudos, além de serem demonizadas. Então, depois de lhe transformarem em um anticristo, agora querem te transformar, estampar suas impressões em minh'alma e "consertar" minha cabeça, a forma que penso, mas essas coisas nunca funcionaram, talvez seja pela falta da terapia de choque, já que tentaram usar até a religião pra isso. Quantas almas ainda serão profanadas por tais criaturas? Personalidades artificiais e moldáveis, superficiais e descartáveis.
Se não fossem por aqueles malditos 8,2 segundos, não seria amaldiçoado. Ou abençoado. Ou paciente. Não, não foi na loteria, foi em uma escola no dia 13/05/2004 às 15:56. Estava atrasado para a aula e morava em outra cidade, entrei correndo pelo refeitório e trombei com uma garota, que estava usando o uniforme da escola, um avental e óculos de segurança. A pancada vez seus óculos voarem junto com meu corpo — e mochila. No chão, a garota que parecia desajeitada pega o óculos e me ajuda a levantar. Naquele momento de pressa, eu tive uma pausa por 8,2 segundos que me arruinou. Essa garota não era perfeita nem nada, mas era linda. Seus olhos eram um pouco maiores, talvez fosse devido ao susto, mas logo percebi que eles eram, juntos com suas sobrancelhas, os maiores indicadores emocionais dela. Seu rosto era ligeiramente redondo com um queixo suave, pequeno, desenhado. Seu cabelo era liso e loiro, chegava até o meio das coisas e tinha uma franja.
— Desculpa! Desculpa! — foi o que a jovem desesperada me disse, culpando a si pelo acidente.
— A culpa foi minha... — foi o que eu disse enquanto procurava por palavras; crescia, em mim, algum sentimento (não sabia qual ainda) — tenho que ir, estou atrasado para a aula. Seu nome é?
— Fran... sou da turma que faz elétrica — disse ela, dirigindo olhos melancólicos em minha direção. Talvez temesse que eu reclamasse dela, pois a escola era rígida.
Aquele dia foi único e estranho. O sentimento em mim estava brotando, ainda não dava pra ver a espécie dele, mas sabia que não era coisa boa, não pra mim. O tempo passou e eu conheci ela melhor, contemplava ela enquanto ela falava. Seus lábios pareciam pequenos, mas seu sorriso enchia meu coração, bem como sua voz. Seus olhos castanhos eram profundos e até insondáveis para os mais insensíveis, tanto é que, se provocar sentimentos fosse crime, eles seriam meus réus então, pois conseguia sentir o que ela sentia apenas investigando-os. Sua personalidade era semelhante a minha, já os gostos não. Entendia suas neuras, individualidades, irracionalidades... Também entendi o porquê de nunca darmos certo: nossas almas eram iguais demais. Tanta compatibilidade virou incompatibilidade, nossas almas eram semelhantes, mas os gostos eram diferentes, e eu sentia isso, mas negava, omitia e rejeitava a ideia de que, embora fôssemos tão parecidos, tudo aquilo não passava de uma idealização. Ela era perfeita demais na minha mente e coração — não digo perfeita em termos humanos, mas nos meus termos, onde ela já era perfeita.
O que me alegraria agora? Não sei. Alguns tolos e precoces diriam "pegar ela te deixaria feliz" e, como resposta a essa citação imaginária, digo que não seria tão simples assim, pois existem coisas a considerar. Hoje digo que deveria ter certas condições, já que agora eu tenho aquele chamado de amor próprio, mas esse não seria meu maior problema. Talvez se o bilhete que comprei hoje na lotérica valesse alguns milhões eu poderia me alegrar, e a felicidade é algo relativo, que depende de vários pontos de vista e várias interpretações.
Agora já são 11 horas da noite de sábado e eu aqui em uma praça passando frio, pensando pensamentos, refletindo reflexões, morrendo paixões. Depois de alguns minutos naquela fria e desértica praça, torno a observar as árvores e a pensar na simplicidade da vida. Pensando na simplicidade, acabo pensando nas necessidades. Pensando nas necessidades, acabo pensando em dinheiro, que acabe me lembrando daquela loteria lá.
Sem precisar ver o bilhete, peguei o smartphone e consultei a internet. O espanto entrou pelo meu esôfago e se apoderou de meus pulmões quando vi os números sorteados na ordem de sorteio: 13 05 20 04 15 56. Na internet dizia que havia apenas um ganhador, e eu bem sabia quem era, pois havia jogado esses números hoje.
— O que vou fazer com tanto dinheiro... ? — acabei sussurrando depois que o espanto esvaiu-se.
— Ganhou na loteria é? — disse um senhor de idade que apareceu sentado do meu lado direito, ligeiramente inclinado e curioso. Ele trajava vestes simples e antigas, e sua cabeça repousava, sobre os cabelos curtos e brancos, uma boina marrom. Usava uma jaqueta simples e marrom, camisa social simples e uma calça social. Estava descalço, mas seus pés pareciam extremamente limpos.
— Se eu disser que sim, vou ser assaltado? — ouvindo tal pergunta, o senhor me olhou de uma forma que me fez sentir ingênuo. Depois de alguns eternos segundos, ele me responde com outra pergunta:
— É essa a loteria que você queria ganhar?
— Não.
— Sabe que nem tudo está perdido ainda, né? — hesitei em responder. Estava confuso, sentimental e com frio, além de milionário.
— O que eu poderia fazer? — respondi, temendo a resposta.
— Me dê esse bilhete que eu lhe darei o que falta para ir atrás dela.
Então dei aquele bilhete que valia milhões de reais nas mãos do estranho que queria me ajudar. No momento que soltei o bilhete, um temor se apoderou de meu corpo, acompanhado de pensamentos pessimistas, quando o velho começou a riscar a parte de trás do bilhete. Foi assim até o senhor devolver-me o bilhete.
— Aqui está — entregou-me o bilhete — aí atrás está tudo que você precisará para ir atrás dela.
Ao virar o bilhete, vejo escrito a palavra "você". Poderia ter sido algo mais filosófico ou profundo, mas aquilo foi o suficiente para me fazer pegar o dinheiro do prêmio e ir atrás daquela minha paixão mal resolvida. Fiquei determinado e esperançoso, pois fiquei sabendo que ela estava começando o mestrado de história da literatura na UFRJ.
Peguei o voo. Não falei com ela pela internet temendo ser ignorado, quero olhá-la nos olhos e deixar que meus sentimentos decidam se continuo ou não, se vale a pena amá-la. A viagem para Porto Alegre foi rápida, o que realmente demorou foi a viagem ao Rio de Janeiro, e também a viagem até o hotel. Tudo parecia demorar e conspirar para que as coisas demorassem, o que me fez perceber o nível de ansiedade que me encontrava na viagem, a qual diminuiu drasticamente após um longo descanso.
Acordando prontamente no outro dia, realizei a higiene matinal, tomei um café reforçado, botei as melhores roupas que consegui comprar no caminho e fui para a faculdade. Chegando na instituição, comecei a procurar onde ficavam as turmas que faziam mestrado. Logo na primeira turma, quando estava passando pela porta e olhando pela janela da porta, a professora me faz um sinal para entrar. Confuso e nervoso, ela percebe minha hesitação e abre a porta pra mim.
— Você quem vai me substituir na última aula, não é? — perguntou ela e, sem dar chance de responder, ela continua — não fique assim, já fui professora substituta e não tem segredo. Faltam alguns tópicos para terminar a aula, e eles estão aqui nesta folha. Boa sorte! — terminou e saiu, como se fosse um juiz que acabou de me sentenciar 30 anos de prisão porque estava com pressa para almoçar, ou buscar o filho na escola, sei lá. Só sei que estava com uma bomba na mão, e precisava fazer algo, já que muitos alunos ouviram o que ela falou comigo.
Como precisava dar uma olhada mais atenta naquela turma, engoli um pouco de saliva e entrei na sala. Sentei na cadeira do professor e, antes que pudesse contemplar aquela sensação de poder que aquela mesa me dava, alguém me chamou:
— Ei! — dizia uma mulher enquanto levantava a mão direita — não vai continuar de onde parou?
— Em qual tópico ela parou? — respondi, procurando por quem fez a pergunta.
— Falta o quinto só — respondeu a mulher, que se encontrava logo na segunda fileira, perto de mim. Quando olhei quem era, meu coração apertou; era ela. Ela estava logo na primeira sala que observei, seria isso aquilo que chamam de destino? Ora, estava satisfeito. Ela estava ainda mais bela (e mais magra), além de ter tirado o aparelho e melhorado no estilo. A cor de seu bronzeado me fez querer tocar em sua amável pele.
Conforme a breve aula prosseguiu, aquela que me fez viajar alguns estados alternava nos modos de me encarar. Ora olhava indicando conclusões, ora olhava com suspeitas. Depois daquelas perguntas permaneceu quieta a aula toda. E o que eu fazia? Tentava não estragar tudo, ser sutil.
Enfim, no improviso e na leitura, terminei aquela aula de literatura. Quando o sinal do fim da aula soou, ela rapidamente se dirige para o centro de convivência da faculdade. Determinado, sigo-a até o local, decidindo qual frase iniciaria nossa conversa. Ela estava acompanhada de uma amiga só, que parecia ser bem íntima dela. Aliás, era bem íntima, já que, enquanto juntava coragem pra falar com ela naquele horário vago, elas trocaram carícias e beijos. Eram namoradas.
Pois é, aposto que nós ainda temos algumas coisas em comum, mas agora é a respeito de gosto. Depois de ver a cena, eu olho pro lado e vejo aquele senhor da praça do meu lado:
— Muito lento — resmungava ele sobre mim.
— Lento? O tempo que tive com ela aqui foi pouco!
— Conhece ela faz quanto tempo?
— Dez anos — respondi o senhor, engolindo um pouco de saliva.
— Pois é, rapaz ingênuo — disse ele, interrompendo sua fala por algumas breves tosses — você teve dez anos para ganhar um coração, mas acabou destruindo o seu.
Depois de ouvir isso, saí nervoso daquele lugar. Tolo que fui, dei crédito para aquelas palavras e permiti a fúria me jogar pra longe dela novamente. Tolo que fui, pois, se ficasse mais um tempo lá, ou se continuasse a olhar para ela, iria perceber um olhar oculto, cheio de sentimentos e com um pouco de suspiro que ela direcionou para mim.
Mas será que fui, de todo, um tolo? Já que, na saída do recinto, dei uma última espiada em seu rosto e, em um momento indescritível, senti esperança de, algum dia, ganhar na loteria.
E é isso, amigos, que eu fiz semana passada. Continuarei a escrever em meu blog com mais frequência depois que voltar de férias.
Abraços

Postado por Caio às 13/05/2014 04:19:59 PM"